Reação Folclórica e Espiritualidade no período Medieval


Entendemos cultura, como tudo aquilo que o homem cria, consciente ou inconscientemente para se relacionar com os outros homens (idiomas, instituições e normas), com o mundo extra-humano (orações, rituais e símbolos). Esse relacionamento tem caráter variado, podendo ser expressão de sentimentos, de domínio social e de controle a natureza, como a busca da compreensão do universo.
Segundo Dürkheim, as representações coletivas traduzem a maneira como o grupo pensa nas suas relações com os objetos que o afetam. Para compreender como a sociedade se representa a si própria e ao mundo que a rodeia, precisamos considerar a natureza da sociedade e não dos indivíduos.
Os símbolos com que ela pensa mudam de acordo com sua natureza (...), é preciso saber atingir a realidade que eles figuram e que lhe dá sua verdadeira significação. Constituem objeto de estudo tanto quanto as estruturas e as instituições: são todas elas maneiras de agir, pensar e sentir, exteriores ao indivíduo e dotadas de um poder coercitivo em virtude do qual se lhes impõe.
                     REAÇÃO FOLCLÓRICA
Havendo um fosso entre a cultura folclórica e a cultura aristocrática, por conta da questão do dualismo do bem e do mal. Na idade média central, assistiu-se uma inversão da tendência que prevalecera até então, a da cultura clerical e sobrepor a laica, tal fenômeno e conhecido como “reação folclórica”, como mostrou o autor Eric Kohler, a recém-formada camada dos cavaleiros buscando sua identidade coletiva recorreu às tradições folclóricas. Desta forma está pequena nobreza procurava fazer frente às antigas linhagens que desde a época carolíngia tinha adotado a cultura clerical.
Assim como nos séculos anteriores, ocorrera a clericalização de muitos elementos folclóricos, agora se dava a folclorização de elementos cristãos e mesmo de simples eventos. O cristianismo ao dessacralizar a natureza (que não se identificava mais com as divindades pagãs), tinha narrado nova etapa no pensamento racionalista, e nesse sentido a oposição folclórica representou a resistência de outro sistema mental, de outra lógica a do pensamento selvagem.


                          CULTO AO CÃO - São Guinefort
Ocorre na diocese de Lyon, e foi estudado por Jean- Cloude Shimitt através de um relato de um frade dominicano em 1257, o cão pertencia a um nobre que o matou julgando erroneamente ter o animal devorado uma criança, quando na realidade tinha defendido a mesma de uma serpente.
Descoberta a verdade dos fatos, o cão foi enterrado num poço diante do castelo e ali plantaram arvores em lembrança do acontecido. Mais tarde o castelo foi destruído pela “vontade divina” e a região se tornou desabitada, mas os camponeses continuaram a ver o cão como mártir e em torno do local onde ele foi enterrado, ali se desenvolve um culto, pedindo sua intercessão, sobretudo quando ele tratava de crianças doentes.O dominicano que narra estes fatos pregou contra tal culto, fez queimar o corpo do animal e as arvores sagradas próximas ao tumulo e ameaçou punir quem fosse venerar aquele local. Mas tal culto ao cachorro permaneceu até o fim do século XIX, devido “a vontade da comunidade camponesa de se inscrever na história”.
                                 A FLORESTA
A floresta está rodeada de ameaças e perigos, reais e imaginários, nela encontramos as nuances do mundo medieval rodeia, isola e aperta. É uma fronteira por excelência, que separa os senhorios e os países uns dos outros, ai surgem os lobos esfomeados, os bandidos e os cavalheiros da pilhagem. A imaginação medieval, com raízes num folclore com origens imemoriais fazia monstros letais, lobos devoradores.
        ESPIRITUALIDADE O BEM E O MAL  
  A cristandade do século XII, procura querer sair das suas fronteiras, começara a substituir a ideia de cruzadas pela a de missão. Neste período não havia divisões estanques entre o mundo terrestre e o além. O Universo era um sistema de esferas concêntricas.
    Mas para a massa Deus existe corporalmente tal como desde cedo à iconografia crista o representa. Essa imagem material de Deus os cristãos herdaram do judaísmo.
O cristianismo depois do Concilio de Nicéia (325), apresentava a adoração dos fieis a um deus em três pessoas: a santíssima trindade, a questão do tema sobre a trindade exerceu grande atração segundo Le Goff nos meios teológicos eruditos e não teve nas massas um eco muito grande.
Um poderoso personagem disputa com Deus o seu poder no céu e na terra, o Diabo. Satã, não tinha na alta idade média papel primeiro plano e ainda menos uma personalidade muito vincada. Apareceu com a nossa idade média e se afirma no século XI, é uma criação da sociedade feudal, é com seus anjos rebeldes, o próprio tipo do vassalo infiel do traidor. O Diabo e o bom Deus, esse é o par que domina a vida da cristandade medieval e cuja luta explica aos olhos da idade média, todos os pormenores dos acontecimentos.
Ele aparece sobre duas espécies:
- Como sedutor: se reveste de aparências aliciantes e enganadoras.
- Como perseguidor: oferece seu lado aterrorizador.
O Diabo perseguidor em geral, não se disfarça se disfarça, aparece a suas vitimas sob aspectos repugnantes. Monge Raul Glaber o viu, numa noite antes do oficio de matina nos mosteiro Saint-Liguer de Champeaux, no principio do século XI.
“Vi aparecer-me ao pé do leito uma espécie de homenzinho horrível de se ver, tanto quanto pude apreciar, era de baixa estatura, tinha pescoço fino, a cara muito magra, uns olhos muito negros, a testa rugosa e crispada, as narinas estreitas, a boca saliente, os lábios grossos, e queixo fugidio e muito estreito, uma barbicha de bode, as orelhas peludas e aguçadas, os cabelos eriçados e emaranhados (...).”
                               REFERÊNCIAS
LE GOFF, J. A civilização do Ocidente medieval. Lisboa: Editorial estampa, 1995.v.1 e 2.

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